Jovem escritor, que tem o dom natural de segurar os leitores com maravilhosos textos e gostinho de quero mais.
ai vai uma palhinha do trabalho dele.
Para Afobório
- Que entre o próximo – anunciou uns demônios.
O homem de terno e gravata entrou. No centro estava o Diabo em uma cadeira mais alta que os demais demônios. Todos vestidos como mendigos, havia mais ou menos uns dez de cada lado. Alguns no chão, alguns sentados em banco de praça, o cheiro era forte e azedo. Restos de comida por toda parte: frangos despedaçados, arroz estragado, feijão apodrecido e garrafas de pinga. O visitante olhou-os, fez cara de nojo e colocou seu lenço no nariz. Todos riram.
- O que faz aqui? – perguntou o Danado.
- Quero ser promovido para Vice-presidente.
- Sabes o preço disto?
- Sim Senhor, minha alma. Estou disposto a pagar.
- Humm... – fez coro e caíram na risada novamente.
- Silêncio! – gritou o chefão – Analisando sua ficha aqui, estou vendo que você ainda é gerente, posso tentar uma vaga de diretor, o resto é contigo.
- Mas...
- Vai querer ou não? Diga logo, a fila é grande.
- Sim Senhor, aceito. O que tenho que fazer?
- O diretor é amante da secretária, faça com que todos saibam, como o presidente é moralista, vai demiti-lo e você vai conseguir a vaga. Assine o contrato de venda da alma no final do corredor à esquerda.
O homem saiu tentando se desvencilhar dos mendigos que queriam pegá-lo.
O demônio...
- Paaaaaaaaaaaaaare o texto! – bradou o Diabo.
- Por quê? – eu pergunto ao meu personagem.
- Engraçadinho, você não sabe que senhor com “S” maiúsculo é o outro e não eu, o Coisa Ruim.
- Ah, verdade, tá certo.
Continuando...
O demônio-porteiro anunciou que o próximo visitante era uma mulher.
Quando ela entrou sentiu o melhor perfume de toda sua vida. Viu homens belos: loiros, negros, ruivos, morenos, todos de beleza ímpar. Uma música agradável, que parecia ser em francês, tocava de algum lugar que ela não conseguia ver. Todos olharam para ela, sentiu-se desejada. O mais belo estava sentado no centro e tragava um cigarro de cheiro adocicado.
- O que a moça faz por aqui? – disse o Sacana olhando para as pernas dela.
- Eu vim falar com o senhor das trevas.
O Tinhoso levantou da cadeira, foi até ela e falou ao pé do ouvido:
- Fala gossssssstosa.
Os outros ameaçaram rir, mas com um pequeno gesto, o Excomungado impediu a bandalheira.
Ela rapidamente corou e se encolheu, colocando os braços na frente do corpo.
- Eu quero um namorado.
- Isto me surpreende, porque pelo que sei você já teve vários namorados, é uma moça muito bonita, não tem dificuldade para atrair olhares masculinos.
- Eu quero um que me ame e não queira sair comigo apenas por sexo, cansei de ser usada como objeto.
O Capeta pôs as duas mãos no rosto, encarou-a bem de perto com seus olhos de fogo e zombou:
- Ai que lindo, quer um amor, quer? Fala de novo pro titio ouvir.
Voltou ao seu posto gargalhando raivosamente, os outros demônios silenciaram, de costas apoiou-se nos braços do trono, virou a cabeça pra trás com um semblante horrendo, tresloucado e vociferou:
- Você enlouqueceu mulher! Amor é muito, muito, muito, muito caro – mentiu.
- Não sabia – responde chorosa.
- Posso te oferecer um homem que você possa fazer de gato e sapato.
- Sim senhor, eu aceito.
- Você deve armar uma situação em que sua prima pareça que está traindo o namorado. Ele é um homem para casar, rapaz bom, de dedicação quase cega, no momento de carência ataque-o. Casará contigo, porém fique ciente que sempre amará a outra. Assine nosso contrato no final do corredor.
Passaram-se alguns minutos e ninguém entrava. O porteiro avisou que a próxima demorou, pois vomitara no banheiro, mas já estava pronta. O Cão sorriu e com estralar de dedos o lugar virou uma grande mesa de jantar em forma de “u”, com leitões, faisões, frutas, vinhos, saladas e pastas. Sobremesas de dar água na boca: pudins, sorvetes, caldas, cremes e assim por diante.
A menina esquálida entrou trôpega. Estava amarelada e com os olhos fundos e mareados, no canto da boca restos da conversa que teve com a privada. Aparentava ser nova, mas sua adolescência se esvaia nos esgotos da cidade subterrânea. Os demônios saboreavam a comida com gosto, podiam-se ouvir as bocas trabalhando nas fibras dos alimentos. Enquanto ela passava, eles diziam “Que delícia!”, “Nunca comi nada igual!”, “Chamem o chef.”
No centro do móvel estava sentada uma mulher perfeita, com cabelos brilhantes, pele macia, seios protuberantes e olhar fatal, olhar em brasas. Era magra de barriga impecável, mas comia sem parar, devorava agilmente o que estava na sua frente, tinha apetite de ogro.
- Quero vender minha alma – disse a petiz com dificuldade e sem direção.
Todos pararam de comer, limparam com guardanapo branco a boca e miraram a infeliz.
A travessa senhora das perdições, mandou:
- Quê? Fale pra fora, minha querida. Estou cansada de sussurros. Está muito fraca, precisa comer, sente aqui conosco.
- Não posso comer! Eu odeio comida! Quero ser Miss Universo!
A Malvada gargalhou e os outros a acompanharam.
- Pegue este frasco aqui e pingue algumas gotas na água de duas das cinco finalistas, o prêmio será seu.
- Obrigado, muito obrigado.
- Não agradeça antes de assinar os papéis.
A jovem saía e ouviu uma voz grossa e masculina. Quando se virou para olhar, todos agora eram soldados mutilados, queimados, doentes e cansados. No meio uma figura que lembrava o presidente de algum país, recomendou:
- Mas antes não se esqueça, para ganhar o concurso de Miss, você deverá dizer: “Eu quero a paz mundial.” Ela sorriu e foi embora.
A porta da antessala fechou e lá dentro as risadas não cessavam.
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Este conto não tem cunho religioso algum, o diabo é mero personagem.
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